sábado, 4 de outubro de 2008

A Valsa dos Adeuses

Ainda nesta semana eu li A Valsa dos Adeuses, de Milan Kundera (amo!).
Em geral eu não gosto de possuir livros; os livros, para mim, são feitos para ser lidos e passados para frente, compartilhados. Mas não os livros do Kundera.
Sempre que eu termino um livro do Kundera, eu tenho a impressão de que algo morreu, mas morreu sem estar completo; como se fosse alguém que partisse sem ter cumprido a sua missão. Parece que me falta algo, que teve um capítulo, uma página, uma simples palavra que eu não consegui compreender a essência... Então, eu decidi quebrar as minhas leis naturais, e os livros do Kundera eu quero ter.
Na última vez que eu fui para Curitiba, eu encontrei (êêêêêê!!!) três livros dele: A Valsa dos Adeuses, que eu li essa semana; A Imortalidade, que eu já tinha lido e amado; e A Brincadeira, que eu vou ler depois que passar as pressões do vestiba.
Tem vááááááárias coisas legais para postar aqui no blog, mas eu estou com preguiça de ficar digitando, então eu só vou postar hoje uma parte massa, que me lembrou bastante Augusto dos Anjos:

“Inclinou-se sobre ela e encostou sua boca na dela. Era uma boca fresca, uma boca jovem, uma boca bonita com os lábios macios lindamente recortados e com os dentes cuidadosamente escovados, tudo estava em seu lugar e era fato que ele, dois meses antes, tinha sucumbido à tentação de beijar estes lábios. Mas, justamente porque essa boca o seduzira, ele a sentira através da névoa do desejo e nada sabia do seu aspecto real: a língua parecia então uma chama e a saliva era um licor embriagante. Só agora, depois de ter perdido sua sedução, essa boca era repentinamente tal qual uma boca, a boca real, isto é, esse orifício assíduo pelo qual a moça já tinha absorvido alguns metros cúbicos de macarrão, de batata e de sopa; os dentes tinham pequenas obturações, e a saliva não era mias um licor embriagante, mas a irmã gêmea do escarro. O trompetista tinha a boca cheia com a língua dela; dava-lhe a impressão de um bocado pouco apetitoso que era impossível para ele engolir, mas que ficava mal rejeitar.”

São Bernardo

Nesta semana eu não tive aula (semana do saco cheio no cursinho), e até que foi produtivo! Eu me dei uma última semana sem estudar antes de pegar pra capar para o vestiba (mas na verdade eu estudei um pouquinho), mas eu li bastante. E um dos livros que eu li foi São Bernardo, de Graciliano Ramos.
A única obra que eu tinha lido dele era Vidas Secas, e eu já tinha gostado dela. Gostei do jeito seco e cru que ele escreve, gostei de não ser mais uma históriazinha bobinha e romântica de final predestinado. Eu só não gostei (ou gostei?) de me sentir tão pequena, tão ínfima, tão inútil depois de ler a obra. Ou melhor, as duas obras.
É doloroso (e é isso que é o mais ridículo) perceber que todos os meus problemas, tão importantes pra mim, tão cruciais, tão grandes, são um nada em relação aos problemas do mundo; é horrível compreender que a minha vida é só mais uma vidinha perfeira, idiota e patética perante as outras vidas. E então eu me sinto mal por isso, e o fato de me sentir mal é mais estúpido ainda, porque isso significa mais problemas estúpidos na minha vida estúpida. E, ao invés de eu fazer alguma coisa para mudar, não; eu fico aqui, acovardada, escrevendo.
...

Enfim, vamos aos fragmentos (nem foram tantos desta vez; acho que eu estou aprendendo a escolher melhor!):

“Necessitando pensar, pensei que é esquisito este costume de viverem os machos apartados das fêmeas. Quando se entendem, quase sempre são levados por motivos que se referem ao sexo. Vem daí talvez a malícia excessiva que há em torno das coisas feitas inocentemente. Dirijo-me a uma senhora, e ela se encolhe e se arrepia toda. Se não se encolhe nem se arrepia, um sujeito que está de fora jura que há safadeza no caso.”

“Conheci que Madalena era boa em demasia, mas não conheci tudo de uma vez. Ela se revelou pouco a pouco, e nunca se revelou inteiramente. A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste.”

“Ali pelos cafus desci as escadas, bastante satisfeito. Apesar de ser um indivíduo medianamente impressionável, convenci-me de que este mundo não é mau. Quinze metros acima do solo, experimentamos a vaga sensação de ter crescido quinze metros. E quando, assim agigantados, vemos rebanhos numerosos a nossos pés, plantações estirando-se por terras largas, tudo nosso, e avistamos a fumaça que se eleva de casas nossas, onde vive gente que nos teme, respeite e até nos ame, porque depende de nós, uma grande serenidade nos envolve. Sentimo-nos bons, sentimo-nos fortes. E se há ali perto inimigos morrendo, sejam embora inimigos de pouca monta que um moleque devasta a cacete, a convicção que temos da nossa fortaleza torna-se estável e aumenta.”

Tô sem net.

Tá foda de postar.